Altos e baixos

Depois de quase dez anos do diagnóstico aprendi que a esclerose múltipla tem várias facetas. Tem dias que me sinto ótima, outros dias aparecem: as vertigens, os formigamentos, as dores de cabeça e nas pernas, impedindo que faça coisas comuns como ir ao banco, a fisioterapia, à escola, em fim coisas rotineiras. Acrescente a isso a fadiga crônica, que nos joga pra baixo e sem forças para fazer o quer que seja. Uma simples caminhada no sol de inverno me deixou exausta e quase desmaiei. Fadiga, formigamentos e dores, esse foi o saldo desse desconforto. A patologia sempre nos faz pensar, refletir sobre o que realmente queremos e podemos fazer. Conviver com altos e baixos, tanto fisicamente, quanto psicologicamente é uma realidade para quem tem uma doença crônica, sem cura, como a esclerose múltipla. Estar aberto e ter novas amizades e atividades são coisas que precisamos para seguirmos em frente com força, garra e vontade de ser feliz e principalmente viver plenamente. Faço uma reflexão, quando estou nesses momentos de baixa, apesar de algumas limitações, quero continuar vivendo, saindo, conhecendo pessoas, viajando, a vida não parou por conta da patologia, estou vive e quero estar plena, dona das minhas vontades. Reconheço que existem momentos em que é preciso parar, submeter-se a pulso terapia, a uma internação, para nos refazermos e continuarmos nossa caminhada com força, alegria e esperança. Nesse último mês conheci pessoas especiais, que tem o diagnóstico de esclerose múltipla, mas não perderam a vontade de viver e de ser feliz. Verdadeiras inspirações e com certeza uma pitada de muito ânimo e alegria. Inspirador conhecê-las e poder desfrutar de suas companhias. Pessoas que cruzam nosso caminho que nos trazem alegrias e nos fazem refletir. Demonstram que apesar do diagnóstico estão bem e vivendo… A mensagem que quero deixar hoje é essa: o tempo não para e é precioso demais para ficarmos lamentando o que não temos e não podemos, vamos nos concentrar no presente, viver de forma a desfrutar cada minuto, entendendo que as limitações nos fazem pensar e encontrar outra forma de realizar aquilo que queremos, mas que não é um impedimento, um ponto final. Não quero pensar que não posso ou não, vou buscar sempre uma forma de ter e fazer o que desejo. A esclerose múltipla não tirou de mim a vontade de viver. Um diagnóstico não pode me parar, tampouco ser uma sentença definitiva, me impossibilitando ou me incapacitando. Sei que muitas vezes terei de fazer ou pensar diferente, mas essa é a graça da vida: reinventar-se sempre!  

Sozinho

Essa é uma constatação: sempre estamos sós. Não importa se moramos com familiares, marido, mulher, filhos. Quando colocamos a cabeça no travesseiro, quando nos recolhemos, estamos sós, com nossos pensamentos, planos, realizações, decepções, angústia e tudo o mais. Por isso façamos essa reflexão: o que nos resta quando estamos a sós? Creio que seja saborear as vitórias, traçar metas, planejar o futuro, sem se esquecer do presente que deve ser vivido intensamente, já que é a única certeza que temos, o tempo efetivamente que possuímos. Sobre o passado só podemos olhar e tentar sermos melhores e maiores, o futuro é uma eterna incógnita, podemos projetá-lo e planejá-lo, mas definitivamente não o dominamos. Estamos sós, somos individualizados, portanto, precisamos e devemos estar bem conosco mesmo, em paz com nossa consciência e postura perante a vida, a tudo que ela nos trás e nos mostra. Viver é preciso, sofrer é opcional, como já disse o poeta, Aceitar e entender o que já passou é fundamental e essencial para conseguirmos viver melhor e crescermos como pessoas. Por esta razão, quando estivermos a sós não devemos ficar lamuriando e remoendo coisas que passaram. O passado deve servir como aprendizado, se erramos, temos de ter em mente que só erra quem faz, quem não faz não erra. Como já disse o sofrimento é opcional. Entender o que passou e tentar melhor sempre, essa é a mágica, o fascínio de poder viver. Falar sobre o que passou às vezes ajuda, mas vamos combinar sem sofrer novamente. Aprender com os erros é salutar, revivê-los sem perspectivas, sem vislumbrar saídas não. Fiquemos bem em nossa intimidade, em paz com nossa consciência, porque no fundo é o que importa.  Erros e acertos fazem parte dessa nossa jornada. Aprender e amadurecer com isso também. Então, da próxima vez que se sentir sozinho, não deixe se abater, estar só é condição e também dado da realidade. Sempre estaremos sós. Não adianta colocar a culpa da sua infelicidade ou felicidade no outro. O que nos acontece e o que nos aconteceu são de total responsabilidade de cada um. Ufa! Quanta coisa que está implícita nessa condição, mas quer saber, já que é assim o jogo, vou jogá-lo. Fazer o que melhor puder, tentando sempre aprender… Isso é crescer, isso é viver!

Respeito

No fim deste mês comemoramos o Dia Nacional de Conscientização da Esclerose Múltipla. Vale lembrar que apesar de alguns anos já comemorando a data, ainda temos muito a fazer, a lutar em busca de direitos, de reconhecimento e respeito. É fundamental termos respeito de toda a sociedade, governo e familiares. Essa patologia, como o próprio o nome diz é múltipla, por isso apresentasse diferente em cada indivíduo. Somos muitos e diferentes. Alguns de nós não precisam de nenhum apoio para caminhar, outros, no entanto, precisam de cadeira de rodas, andador, muletas, bengala e ainda há aqueles que passam por surtos e ficam literalmente paralisados, sem os movimentos, sem visão etc. Difícil fazer com que o outro entenda a patologia que nos acomete, pois somos diferentes. Não existe regra para as sequelas deixadas pelos surtos e pelas crises. Uma realidade é a fadiga, que nos aflige, na maioria dos casos, nos deixa sem forças para realizarmos tarefas simples do dia-a-dia. Costumo dizer que as minhas pernas vão acabando, deixando-me sem forças para caminhar. Infelizmente isso ocorre com a maioria de nós. Muitas vezes os outros acabam nos taxando de preguiçosos e sedentários, Impossível saber ao certo a dor do outro ou sua limitação, por isso é fundamental haver respeito, Não adianta campanhas de esclarecimento e conscientização, se não existir respeito. Esse é o requisito essencial para convivermos. O princípio do respeito é fundamental para vivermos bem e em paz. Já ouvi alguém dizer que se trata de caridade deixar pessoas com deficiência utilizar o caixa eletrônico destinado a elas ou vagas de estacionamento demarcadas especialmente para pessoas nessa condição. Entendo não se trata de caridade e sim de respeito. Trata-se de respeitar a condição do outro e garantir que ele tenha acesso e direitos como todos os cidadãos. Essas medidas podem, a princípio, parecer concessão de privilégio, mas trata-se apenas de garantir que pessoas em condições adversas tenham o mesmo direito que a maioria das pessoas. Creio que esse é o único caminho para conquistarmos o reconhecimento e tratamento adequados. Não interessa que tipo de problema você tem, pode ser uma patologia que trás limitações, como a esclerose múltipla, o fato é que todos, sem exceção, merecem e precisam ser tratados com respeito.

Crescer!

Dia desses fiz uma reflexão: estou chorando menos… Por que será? Problemas existem sempre, mas aquilo que me desequilibrava facilmente, emocionalmente falando, agora não consegue mais. Não que eu tenha me tornado a mulher maravilha ou uma super heroína qualquer, o fato é que cresci, amadureci. O passar do tempo nos traz força e sabedoria, talvez nosso físico não seja tão exuberante, mas a cabeça com certeza está melhor. Nunca me esqueço de uma coisa dita pela professora de português do meu sétimo ano de escola, que falava à sala: “vocês estão com uma cabecinha muito pequena”, mas no final do ano disse: “vocês começaram o ano com uma cabeça pequena, mas agora já estão com um cabeção”. Em outras palavras, com certeza, quis dizer vocês amadureceram. Sinto-me grata por ter passado por várias tempestades e agora estar aqui em pé. Muitas coisas aconteceram como o diagnóstico de esclerose múltipla, o nascimento da minha filha, a separação, a mudança de casa, a perda da CNH, por conta da patologia, várias coisas nessa minha existência, porém tudo me fortaleceu e influenciou diretamente na pessoa que sou hoje e como vejo o mundo. Antes tinha muita pressa para que as coisas acontecessem, hoje estou mais paciente, ainda ansiosa, mas em menor escala. O que quero dizer com isso é que a vida nos dá oportunidades de crescermos todos os dias com nossos erros e acertos. Não paramos de errar, é verdade, porém sempre há a possibilidade de fazer diferente do que fizemos no passado, isso é amadurecimento, crescimento. Dizer que algumas coisas já não são tão grandes hoje, como eram no passado, é fato, hoje me sinto muito maior e mais fortalecida. Ainda há muito que fazer e o que crescer. Essa certeza me move e me impulsiona. Faz com que esteja sempre em movimento, correndo atrás dos meus sonhos. O importante é alcançar as metas, não a qualquer custo é claro, mas sempre avaliando e ponderando o caminho e os meios de conquistar o que se deseja. Não sofrer com os fracassos e as derrotas, simplesmente entender como aprendizado, como vivência. Envelhecer faz parte, pois o tempo não para… O certo é que escolhemos como queremos envelhecer e amadurecer, saboreando cada segundo, cada momento ou lamentando o passar do tempo e as experiências vividas, olhando para trás e sofrendo novamente pelo que fez e o que não fez. Vamos caminhar sem culpa e sem medo, isso é crescer, é amadurecer. Confesso que esse tem sido meu lema…  

Sonhos

Hoje não falarei de solidão, mas farei uma reflexão sobre enfrentamento, encarar a vida. Por mais duro que pareça é assim que estamos: sozinhos. Podemos estar rodeados de pessoas, no trabalho, na escola ou em casa, mas quando colocamos a cabeça no travesseiro, o que nos resta são os pensamentos, os sonhos. Estar sozinho, não é sinônimo de solidão. Estar sozinho é entender que cada um de nós é um indivíduo, uma pessoa que erra, acerta, tem medos, angústias, pensamentos e sonhos. Não existe nada mais particular e peculiar que o pensamento. Ele é de cada um. Quantas vezes pensamos e não falamos, nessa hora percebemos que estamos sós. Aquele pensamento, aquele desejo e aquele sonho, intrínsecos e bem íntimos, não partilhados, pertencem somente a quem pensou e a quem sonhou. Aí está a magia, somos únicos e incomparáveis. Somos completos e cada um tem uma maneira de encarar a vida e as adversidades que ela apresenta. Nada, nem ninguém poderá deturpar isso. Assim como ninguém pode mudar o que somos, a não ser que desejemos. Temos total liberdade de fazer isso ou aquilo. Pode parecer loucura esse ponto de vista, mas pensemos: O pensamento é livre e o sonho não depende de um corpo para ser vivido, sonhado. Podemos tudo, só depende da nossa imaginação. Um exemplo disso foi um sonho que tive um dia desses: Sonhei que estava andando numa bicicleta, o vento batendo no rosto, os cabelos balançando, num lugar lindo, um jardim cheio de flores, com árvores frondosas e aquele sol lindo de primavera. Quando acordei ainda sentia aquela sensação boa, como se realmente tivesse vivido aquilo. Seria bem possível ter vivido realmente isso, se soubesse andar de bicicleta, mas o fato é que não sei, nunca andei numa bicicleta. Fiquei tão satisfeita com o sonho que me senti extasiada com aquela “experiência”. Os sonhos nos impulsionam, nos empurram. A partir disso buscamos e fazemos a maioria das coisas que queremos. Ninguém pode roubar nossos sonhos e nossos pensamentos, esses são os bens mais preciosos que possuímos. Não os deixaremos de herança para ninguém, por mais que amemos outra pessoa. Portanto, não podemos e não devemos abrir mão deles, jamais. Mesmo que não concretizados, nós já os incorporamos, os idealizamos e assim fazem parte do que somos. Não se vive só de sonhos, isso é fato, porém ninguém vive sem sonhos. Não existem sonhos pequenos ou grandes, o que existem são sonhos. Cada um de nós pode aquilo que nossa imaginação quiser e desejar, ou seja, tudo. Concretizar os sonhos é outro departamento, mas idealizá-los é livre… Portanto, continuemos sonhando…

Sobre Viver

E depois? Depois do diagnóstico, depois da medicação, depois da internação… O que fazer depois disso? Essa é pergunta que não quer calar. Tenho pensado insistentemente nisso… Tenho escrito sobre isso sempre, mas é uma questão que está me incomodando… Há quase dez anos recebi o diagnóstico de Esclerose Múltipla. No início demorei a assimilar e aceitar a situação. O fato é que depois disso tive uma filha, escrevi um livro e me aposentei. A essa altura da vida, vejo-me novamente cheia de dúvidas e receios. Pensando o que devo fazer e o que posso efetivamente fazer? A maternidade me trouxe alegrias imensas e sentimentos inimagináveis, um amor profundo e incondicional. O livro trouxe-me uma alegria imensa e uma satisfação ao mesmo tempo. A aposentadoria trouxe-me alguma estabilidade financeira, mas me desestabilizou emocionalmente, enchendo-me de dúvidas e sentimentos não tão bons. Depois desses acontecimentos, passei por uma separação, foi uma decepção amorosa muito dura, como normalmente são as separações; deixou muitas mágoas e cicatrizes que ainda reverberam dentro de mim. Hoje estou aqui tentando escrever algo que valha a pena ser lido. Sinto que ainda posso produzir, sinto-me viva e plena. A esclerose múltipla não tirou a minha vontade de fazer a diferença, muito pelo contrário, agora sinto que devo e quero fazer algo relevante. Pode ser que seja pura pretensão, aos olhos de muitas pessoas, mas tenho esse sentimento comigo. Sinto-me bem, apesar de algumas imposições da patologia, como o andar com ataxia e desequilíbrio, a perda parcial da visão periférica. O que quero dizer com isso é que apesar do andador, da fadiga e dos obstáculos, estou sobrevivendo, mas quero mais e preciso viver… Quero sentir-me produtiva novamente. Alguém, que de alguma forma, faz a diferença. Todos nós temos essa possibilidade e essa condição. A vontade e a capacidade não foram perdidas com o diagnóstico, com as internações e com a medicação. E agora me pego nesse dilema, o que fazer? E pra onde ir? As respostas ainda não tenho, mas continuarei firme na minha busca e nos meus propósitos. Um novo livro… Ações sócias… Amor… Como diz a canção: “você tem fome de que?” Respondo: tenho fome de viver, de fazer, de acontecer…        

Simplesmente Viver

O tema do Dia Mundial de Conscientização da Esclerose Múltipla é: “Simplesmente Viver”, porém não é tarefa fácil, para ninguém, não é privilégio das pessoas com esclerose múltipla. Há duas formas de se levar a vida: assistindo ou atuando. Você pode simplesmente parar, sentar e vê-la passar ou protagonizá-la. Atuar significa fazer, acontecer. É como diz a canção: “quem sabe faz a hora não espera acontecer”. Estou vivendo intensamente essa questão. Não quero ver a vida passar, assistindo-a simplesmente. Posso fazer a diferença. Escrevendo, apresentando-me, colocando-me nas ocasiões pertinentes como cidadã, como pessoa. Esta semana aconteceu um fato curioso. Estava num grupo discutindo o que seriam as virtudes do ser humano, quando uma pessoa disse que a “caridade” é uma virtude, concordo, só não concordei com o exemplo dado por ela, qual seja: – “quando vemos uma vaga de estacionamento preferencial para deficiente ou idoso” não devemos estacionar lá e sim deixar para pessoas que estejam nessa condição estacionar. Ora, isso não pode ser encarado com caridade, pois é um direito. Não estacionar nesses locais é respeito a esse direito. Fiquei indignada com essa colocação, mas ela reflete o pensamento da maioria das pessoas. Que dar preferência é caridade e não respeito. Trouxe esse exemplo para refletirmos juntos. Cabe a nós quando estivermos em situação como essas cobrarmos o respeito aos direitos das pessoas com deficiência ou necessidade especial. Isso é atuar, deixar de ser expectador e ser um agente atuante. Nessa situação coloquei minha posição e fiz aquelas pessoas refletirem essa questão. Tanto nas pequenas coisas como nas grandes temos que nos posicionar, colocar nossa opinião e, minimamente, provocar a reflexão dos demais. Só dessa maneira, poderemos mudar e provocar mudanças no meio onde vivemos. Estamos aqui porque existe um propósito para isso, então precisamos estar atentos as situações e fazer acontecer. Não devemos e não podemos nos esconder da realidade e das situações apresentadas. Somos mais e maiores e podemos fazer a diferença, Isso é viver!  

Sou Mãe

Há quase dez anos atrás quando recebi o diagnóstico de Esclerose Múltipla, a primeira pergunta que fiz ao médico foi: “posso ter filho?” e ele respondeu: “pode, só recomendo que não tenha mais do que seis, pois dá muito trabalho”. Quando recebi o diagnóstico não tinha filho, mas tinha muita vontade de ter, por isso da minha pergunta. Fiquei aliviada e menos preocupada, pois pensei: “se a Esclerose Múltipla não pode me impedir de ter filho, não poderá me impedir de nada”. E foi assim, quatro anos após o diagnóstico engravidei e hoje tenho uma filha de cinco anos. Depois do diagnóstico o melhor período que tive, fisicamente falando, foi o da gravidez, não tive problemas de grávida, como inchaço, pressão alta, diabete, peso excessivo etc., tampouco problemas decorrentes da patologia. Depois do nascimento da minha filha, compreendi a razão da minha existência. Quando ela veio ao mundo, senti um amor tão grande, que parecia que nunca tinha vivido sem ela. Amor incondicional e infinito, aí entendi o que é amor de mãe. Tenho certeza de que não sou perfeita e nem tenho essa pretensão, mas sei que o amor envolvido nessa relação: mãe e filha é imenso e é uma experiência rica e única, que mudou completamente a minha vida e os meus valores. Mais do que ensinar, aprendo com ela. Tenho esse presente todos os dias. Não imagino a vida sem ela, sem essa convivência, agradeço todos os dias a honra de ser a mãe da minha pequena e amada Ana Clara.

Resolver!

Muitas vezes sinto que ando para trás, como se fosse retrocedendo na minha jornada, na vida. Comecei a pensar o porquê disso e cheguei a uma conclusão: as coisas que vão e voltam, certamente, ainda não estão resolvidas, portanto, ainda não fazem parte do passado. Então o remédio é resolvê-las, mesmo não sendo tão fáceis. As dificuldades e obstáculos que encontramos em nosso caminho sempre são oportunidades para melhorarmos e crescermos. Estou vivendo com os meus pais, minhas irmãs e minha filha, enfim, família. Sempre encarei esta situação como provisória e tenho a sensação de que a qualquer momento devo sair de casa. Morei casada e sozinha, fora da casa da família, por quinze anos. Voltei para casa numa situação adversa, não estava bem, Por conta da esclerose múltipla tinha desmaios e sonambulismo constantemente, além de estar passando muito mal com a aplicação da medicação Rebif44. Já faz tempo, cerca de dez anos, que isso aconteceu, portanto há quase dez anos voltei para casa. Mesmo assim, não me sinto em casa. Por isso estou empenhada em resolver esta questão. Depois de tanto tempo e dos acontecimentos dos últimos anos, concluo que o melhor que poderia me acontecer, realmente aconteceu. Estou em casa. Desfruto da companhia dos meus pais, da minha filha e das minhas irmãs. Não adianta olhar para trás e olhar com saudosismo a época em que morava só, como se esta situação fosse a ideal sempre. Hoje compreendo que preciso aceitar que a situação mudou: sou mãe e tenho esclerose múltipla. Tenho que admitir que a patologia me trouxe limitações, primeiro a bengala, agora o andador, o fato de não poder dirigir, por conta de uma lesão no nervo ótico, que reduziu a visão periférica, Por que lutar contra os fatos? Tenho de procurar ser feliz com o que tenho, sem ilusões e sonhos inatingíveis, pelo menos por hora. As frustrações que experimentei até aqui não podem me pautar, não podem ocupar minha mente, minha vida. O que passou passou, não é assim? Deixar no passado o que é do passado e viver com alegria o presente. Derrotar os fantasmas e ficar bem. Esse é o meu objetivo. “Sempre em frente, não temos tempo a perder…”, como diz canção. Feito essa reflexão, penso no que conquistei e o que tenho e como devo ser feliz com isso.

VIVER!

Viver não é tarefa fácil, mas quem disse que seria? Conviver com diversidades e adversidades realmente requer muita paciência, tolerância, amor, respeito e verdade. Acredito que o primeiro passo é admitir, somos diferentes, cada um é uma pessoa com pensamentos, sentimentos e vontades próprias. Sendo assim, para conseguirmos viver em sociedade só com regras e principalmente respeito, pois elas não adiantam em nada se cada um não se conscientizar e respeitar o outro como ele é e com o que ele se identifica e busca. Enquanto pacientes com esclerose múltipla já passamos muitas situações difíceis e até constrangedoras, Nessa semana precisei resolver alguns problemas no banco e na Prefeitura. Por conta disso precisei levar uma bolsa de mão e uma pasta com documentos. Recebi uma carona, mas ouvi: “você vai levar o andador? Não precisa te esperarei, vá com a bengala!” Argumentarei que ficaria mais segura e confortável, mas notei na expressão da outra pessoa uma insatisfação e contrariedade. Resolvi calar-me e ir somente com a bengala. Não foi fácil o caminho até a porta de entrada era completamente esburacado e com acessibilidade zero. Nessa hora percebi que agi errado e deveria ter ido com o andador, pois fiquei com muita dor nas pernas e fadiga. Cobrar que o outro deveria ter compreendido que eu precisava do andador não é a saída, na verdade eu deveria ter me imposto e mostrado a real necessidade que tenho. A conscientização e a compreensão passam por todos nós, afinal só cada um sabe da sua real necessidade. Muitas vezes estamos tristes ou depressivos e também descontando em outras pessoas, com atitudes rudes, repostas mal dadas e mal compreendidas. Viver é aprender. Reconhecer que por vezes precisamos dar alguns passos pra trás para conseguir seguir em frente e alcançar os objetivos almejados e finalmente vencer. Os obstáculos servem e tem de ser superados, sejam eles físicos mentais e/ou espirituais. Ter medo faz parte, somos humanos, com certeza ele aparecerá, a questão é como lidaremos com ele. Ele não pode nos impedir, deve servir de alerta e de cautela. Como diz a música: “Nós somos medo e desejos, somos feitos de silêncio e sons…tem certas coisas que eu não sei dizer…” Não sabemos tudo é claro, assim como não podemos tudo, mas não precisamos nos esconder, a solução é viver, só assim aprenderemos. Isso serve para todas as situações. Viver sem vergonha da condição que temos e que nos está imposta.