Saudade

Fico pensando o que saudade tem a ver com esclerose múltipla, provavelmente nada.

Mas como os quebradinhos também são humanos, eles também sentem saudades.

Saudades gostosas de objetos, tempos e pessoas.

Mas, principalmente, de coisas que eram ou foram.

Chegamos à conclusão que tudo era diferente só pelo fato de ter sido.

Recebi uma visita e minha mente tornou-se nostálgica, de tempos que já se foram.

Revivi um tempo, conjunturas. Revirei bastante tempo para dormir. O que era aquilo; que me tirava o sono?

A recordação, a esperança de fazer diferente, de planejar.

A oportunidade de abrir a janela d’alma  para sonhar de novo.

E quem diz, que reviver estórias não é viver no presente?

Para mim, o mundo tinha acabado com o diagnóstico e outras incertezas tristes da vida. Renasceu quando muitos não desistiram de mim: colegas, profissionais da saúde, amigos e família.

A fênix reviveu, com adaptações, transformações; mais forte talvez.

De repente , ela morre de novo e tudo se instala novamente, como num circuito eletrônico semi-programado.

Tudo passa a nossos olhos num simples relato de meio de tarde.

No fim, éramos nós portadores capazes de tantas coisas. E, percebemos que toda humanidade era capaz  de tanta coisa.

Não foi nossa dificuldade de andar, de saltar, de tomar banho sozinho ou até de  deitar que nos fez diferente. Foi nossa capacidade de sentir.

E ainda são os olhos velados, que resvalam em todo passado, de sentirmos que tínhamos ou éramos e não do que temos e somos.

Saudade… Ausência…

 

AUSÊNCIA

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Carlos Drummond de Andrade